Ruas por ordem de comprimento
Decidimos organizar as ruas por género, homens e mulheres. Cada retângulo representa uma rua do Porto. A sua altura é proporcional ao comprimento da rua. Clica em cada retângulo para saberes o nome da rua e o seu comprimento.Sim, ainda não acabou! 😅
Quase lá... 🏃
O comprimento total das ruas dos homens é 14 vezes maior que o das ruas das mulheres.
A opressão das mulheres assume desde sempre uma componente territorial. Na Grécia antiga, o espaço público e a participação cidadã na Polis era reservada aos homens. Às mulheres e aos os escravos era consagrada a esfera do lar e da produção, e o seu acesso a várias partes da cidade era proibida. A partir do século XIX, e à medida que as sociedades mais economicamente desenvolvidas se foram industrializando, reforçou-se o conceito das "esferas separadas". Segundo esta concepção socialmente construida, aos homens cabia a responsabilidade de providenciar os recursos economicos à sua família, através do trabalho assalariado que obrigava à deslocação pela esfera pública. Às mulheres, cabia a responsabilidade dos cuidados da casa e dos filhos, ficando a sua atividade restrita à esfera doméstica.
Ainda hoje, o espaço público é local de disputa de construções sociais de género e de assimetrias de poder.
Não só as mulheres estão subrepresentadas, como as que dão nome a quase todas as ruas de maior destaque são santas. Retirando as figuras religiosas e dinásticas, sobra um minoria de ruas com nomes de mulheres de letras, artistas, professoras, uma engenheira e uma cientista.
De notar que, apesar desta classificação por profissões, várias destas mulheres foram reconhecidas pelo seu trabalho político. Virgínia Moura e Maria Lamas são exemplos, ambas com um legado de resistência antifascista e de luta feminista.
A atribuição de nomes a ruas é uma forma de homenagem e de não deixar cair em esquecimento legados que merecem ser recordados.
Iniciativas como a petição para a atribuição do nome de Gisberta Salce a um arruamento da cidade, lançada pela Marcha do Orgulho do Porto, provam isso mesmo. O legado de Gisberta, mulher trans, vitima de transfobia e assassinada em 2006, merece ser recordado.
Apesar desta mobilização, a resposta da Presidente da Comissão de Toponímia da cidade foi a de que "Não conseguimos estabelecer uma relação entre a Gisberta e o Porto" e que "achamos que a pessoa em si nada fez em prol do Porto". Esta resposta foi entretanto ultrapassada por um voto da comissão em que finalmente se permitiu que o nome de Gisberta fizesse parte da bolsa de nomes de futuras ruas da cidade. Isto é a negação de um legado, muito mais do que um caso isolado, que mobiliza a sociedade e trouxe o termo "transfobia" para o debate público. Decisões como esta são condenações à invisibilização de mulheres e de grupos minoritários.
A toponímia não é um simples pormenor ou processo arbitrário: é feita de escolhas políticas e ideológicas que reforçam narrativas hegemónicas. É preciso refletir sobre elas.
Selecionado na categoria Best Visual and Data-Driven Stories of 2022 pelo The Pudding
Metodologia
Os dados e o código utilizado para este ensaio estão disponíveis de forma aberta aqui. Utilizamos os dados do Open Street Maps relativos às localizações e aos nomes das ruas, a ferramenta Mapbox para o mapa interativo.
Referências
Franck K.A., Paxson L. (1989) Women and Urban Public Space. In: Altman I., Zube E.H. (eds) Public Places and Spaces. Human Behavior and Environment (Advances in Theory and Research), vol 10. Springer, Boston, MA.
Santiago, Isabeli & Medeiros, Alicia. (2020). O Tour Feminista Da Cidade do Porto como uma Prática Poética de Resistência Urbana e Historiografia Radical. Inhumas, ano 8, n.21. ISSN: 2316-8102.